domingo, 1 de novembro de 2009

SONHOS DISTANTES

(por Luiz Henrique Prieto)

A caminho do laboratório, entretido com meus próprios fantasmas, tenho chamada a atenção por um vulto que passa apressadamente e quase me atropela.

Refeito do susto, identifico Indiazinha, uma adolescente do programa sócio-educativo.

Pergunto: “- Onde vai, nessa correria toda ?” E antes mesmo que ela responda, completo: “- Fazendo curso ?”

Um sorriso se abre.

Afinal, Indiazinha faz parte de um universo de pessoas invisíveis.
Sim, essas pessoas que estão por aí, o tempo todo, mas ninguém vê: o porteiro da seu prédio, a faxineira, o gari, o motorista e o cobrador do ônibus, a “moça do café”, o office-boy (ou a office-girl, no caso da adolescente).

Pessoas que cruzam o nosso caminho o tempo todo, mas que negamos, por algum motivo estranho, que os estudiosos de plantão teimam em chamar de “Fenômeno da Invisibilidade”.

Chamada para um mundo “real” (puxa, alguém me notou !), Indiazinha esboça um sorriso tímido e começa a falar sobre o curso: uma ONG oferece aos adolescentes algumas alternativas de cursos, com a finalidade de reinserí-los na sociedade.

Conceito muito bonito na teoria...Já na prática...Deixemos isso para outro post.

Voltando ao curso...

Indiazinha diz estar fazendo curso para Auxiliar de Enfermagem.
Feliz da vida, pergunto se é o que ela gosta.
Meio sem jeito, dá um sorriso amarelo, típico das crianças que ganham roupas ao invés de brinquedos, no Dia das Crianças e no Natal, e diz, quase num sussurro:
“É, né ? Fazer o que ?”

Fico mudo diante da realidade nua e crua.

Apenas acompanho o andar apressado de Indiazinha.
Fitando aquela figura, ainda menina, mas com responsabilidades de adulta, correndo para abraçar um futuro que não é seu.

Triste realidade a nossa.

Foi-se o tempo em que, invariavelmente, nos faziam a clássica pergunta:
“O que você quer ser quando crescer?”.
A resposta, nos dias atuais, é simples: “O que der pra ser.”

Você não escolhe a sua profissão.

A vida escolhe por você!

Quantos não gostariam de fazer medicina, tornarem-se engenheiros, jornalistas, advogados e por aí vai ?

Infelizmente, a equação é bastante cruel: Sonhos ≠ Realidade

Querer é poder? Na teoria, sim.

Pessoas de origem humilde, feito Indiazinha, querem muita coisa: sair do aglomerado onde moram (nome chique para a famigerada favela), ter o que comer na hora do almoço, ter o que vestir, não precisar mais colocar baldes para conter as goteiras quando chove (cai mais água dentro de casa do que do lado de fora), poder usar uma roupinha bacana, ir ao cinema, enfim, um sem número de coisas básicas para boa parte da população, mas que muitas vezes, estão muito além da realidade dessas pobres criaturas.

Pior ainda, quando são os pais que decidem o que o filho vai ser quando crescer: “Menino, jogar bola não dá futuro...Menina, você quer ser o quê ? Atriz ? Ah, vá estudar senão vai ficar aí esquentando barriga no fogão e esfriando no tanque, feito sua mãe." (a fala, naturalmente, é da matriarca da família).

Aí eu pergunto: e os sonhos desses filhos, ninguém leva em consideração?
Será que o fato de querer exercer uma profissão que lhe traga PRAZER, SATISFAÇÃO, ALEGRIA e, conseqüentemente, FELICIDADE é tão ruim assim?

Por mais simples que seja o sonho de uma carreira profissional para alguém, não devemos acordá-la para a realidade.

Precisamos sim, apoiar, incentivar, mostrar de forma positiva, os prós e os contras de uma determinada profissão, seja ela de pedreiro, gari, médico, advogado, carpinteiro (você aí...lembra do carpinteiro mais famoso da história?).

Enfim, não podemos querer para os outros, aquilo que não tivemos coragem de buscar para nós.

Não queira transformar o seu filho no médico que você gostaria de ter sido.

Não culpe seus filhos pela carreira fracassada e infeliz que VOCÊ teve.
Afinal, as escolhas são suas. Conseqüentemente, o resultado delas também.
Você colhe o que plantou a vida toda.
Se plantou limões, não queira colher laranjas.

Assim, não tente colher frutos antes do prazo.
Permita que as sementes germinem, floresçam, cresçam, transformem-se em frutos e, principalmente amadureçam.

Mas, lembre-se que, para chegar ao estágio final, todo o processo requer AMOR, DEDICAÇÃO, RESPEITO e ATENÇÃO.

E não se assuste se, depois de fortalecido, o fruto se transformar em uma frondosa árvore e vier a lhe oferecer repouso sob seus galhos.

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